02 de Dezembro de 2025 • Leitura: 22 min

Formação academica em Leiria, Portugal: Saúde mental, Elaine e AIPA

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Formação academica em Leiria, Portugal: Saúde mental, Elaine e AIPA

Falamos em nome da equipa da Elaine Pinheiro quando dizemos que caminhar com responsabilidade pelo campo da saúde mental é, antes de tudo, aceitar que a formação nunca se encerra.


Essa sensação de estar sempre entre o “já sei” e o “ainda falta tanto” acompanha quem atua com escuta, com presença e com ética. Não importa o tempo de experiência ou o lugar do mundo onde a clínica acontece — há sempre mais camadas a serem escutadas, mais histórias que pedem cuidado e, também, mais recursos que podem ser construídos para sustentar esse tipo de trabalho. Foi exatamente nessa travessia entre o que já existe e o que pode ser aprimorado que nasceu a formação Elaine Pinheiro + AIPA, sediada em Leiria, Portugal.


Leiria: onde o conhecimento encontra o cuidado

Quem passa por Leiria percebe que não se trata apenas de um ponto geográfico no centro de Portugal.


Existe um ritmo particular na cidade, um jeito de encontrar espaço entre o silêncio e o movimento, que combina bem com os caminhos da escuta clínica. E é nesse contexto que a parceria com a AIPA – Associação Internacional de Psicanálise Aplicada se estabeleceu, com o objetivo de oferecer uma formação académica séria, profunda e atualizada no campo da psicanálise e da psicoterapia.


O que se buscou ali não foi apenas mais um curso, mais um certificado ou mais um título para acumular. Pelo contrário. A proposta nasceu com base numa inquietação comum: como criar uma formação que realmente ajude a transformar a escuta clínica, respeitando as exigências éticas, técnicas e humanas da prática atual?


Essa pergunta, que atravessa tantos profissionais diariamente, foi usada como bússola para construir uma proposta formativa alinhada com o que é vivido na clínica real — aquela que se dá no cotidiano, entre pacientes reais, com demandas que não cabem nos manuais.


Uma formação pensada para a prática viva da clínica

Quando falamos em formação, muitas imagens podem vir à mente. Salas de aula, apresentações teóricas, textos longos, exigências burocráticas. Mas a proposta construída em Leiria com a AIPA se afasta dessa lógica tradicional. A ideia aqui é outra: colocar o aluno (que também é clínico, que também é humano, que também se escuta ao escutar) em movimento com conteúdos que façam sentido para a vida e para a prática.


A formação oferecida tem como base a psicanálise contemporânea, reconhecendo os autores clássicos e integrando reflexões atuais que tocam nas realidades clínicas vividas hoje — desde atendimentos em contextos de crise, passando por situações de sofrimento psíquico crónico, até os temas que envolvem espiritualidade, vínculos familiares, transgeracionalidade e muito mais.


Além disso, a estrutura do curso foi pensada para permitir acesso gradual, ético e responsável ao campo clínico, com ênfase em supervisão, partilha de casos, reflexão conjunta e, claro, um olhar constante para o impacto que esse trabalho tem também sobre quem atende. Afinal, cuidar de saúde mental envolve inevitavelmente cuidar de si mesmo ao longo do processo.


Uma travessia entre continentes e experiências

O percurso que trouxe a formação da Elaine para Leiria não começou de forma aleatória. Ele foi construído a partir de anos de experiência no Brasil, de presença constante em eventos formativos, de escuta de centenas de profissionais e, acima de tudo, de uma aposta: é possível formar com ética e profundidade sem perder o enraizamento na realidade do cotidiano clínico.


Foi a partir dessa experiência que a metodologia aplicada aqui foi desenhada. Isso inclui:

  • Um modelo de ensino híbrido, que respeita os diferentes ritmos de aprendizagem e contextos de vida;
  • Aulas presenciais que valorizam o encontro, o debate e a troca real entre colegas;
  • Estrutura curricular fundamentada em evidência científica, autores reconhecidos e pensamento crítico;
  • Supervisões clínicas conduzidas com responsabilidade e escuta cuidadosa;
  • Materiais de apoio que ampliam a reflexão sem engessar a prática;
  • Espaço para dúvidas, perguntas, desconfortos — tudo aquilo que também faz parte do crescimento profissional honesto.


Em cada módulo, a formação convida à reflexão sobre aquilo que, muitas vezes, passa despercebido: como é que eu escuto? o que é que me atravessa quando atendo? o que é que deixo de perceber? Essas perguntas, tão simples e tão potentes, foram incluídas no centro do percurso formativo, não como um adorno, mas como parte da construção de um profissional mais ético, mais atento e mais disponível para o outro — e para si.


Quando o que se aprende faz sentido também para a vida

É comum que, durante a formação, alguém diga que não está ali apenas para aprender a atender melhor. Está ali também para conseguir sustentar com mais presença aquilo que já vive na clínica — ou aquilo que deseja viver, mas ainda não teve espaço, coragem ou oportunidade. E isso faz todo sentido.


Uma formação em saúde mental não ensina só técnicas. Ela precisa abrir caminhos para que a pessoa compreenda melhor o seu lugar na escuta. E é exatamente por isso que, ao longo da formação, há um convite constante à leitura, sim, mas também à escrita, à construção de pensamento próprio, ao exercício da presença e da responsabilidade diante do sofrimento psíquico do outro.


Ali, cada caso clínico não é tratado como um exemplo genérico. Pelo contrário: é discutido com ética, com sigilo e com a certeza de que existe sempre mais de uma camada em jogo. As supervisões tornam-se espaços de descoberta, de elaboração, de nomeação do que às vezes parecia apenas uma sensação vaga durante o atendimento.


E não raro, nesse percurso, os participantes descobrem algo ainda mais potente: o conhecimento técnico pode (e deve) ser usado a favor da escuta humana. Isso muda tudo. Porque tira o peso da performance e coloca o foco na responsabilidade. Não se trata de atender para "acertar", mas sim de sustentar um lugar ético e presente, mesmo quando a escuta se torna desafiadora.


Alguns pilares que sustentam essa proposta formativa

Para além das palavras, há uma base muito sólida que sustenta essa formação. Alguns dos pilares que têm sido reforçados desde o início do curso incluem:

  • Acesso ao saber sem hierarquização rígida: todos aprendem com todos, independentemente do tempo de estrada.
  • Estudo orientado por eixos clínicos, e não apenas por escolas teóricas fixas.
  • Reflexão ética permanente, para não perder de vista a complexidade do humano.
  • Presença internacional de docentes, que ampliam o olhar e as referências culturais.
  • Relação constante entre teoria, técnica e subjetividade, para que o conhecimento não seja apenas decorado, mas vivido.


Esses eixos atravessam cada etapa do curso e mostram que uma formação em psicanálise pode, sim, ser rigorosa, atual e afetiva ao mesmo tempo. Não há contradição entre profundidade e acolhimento. Pelo contrário: é dessa combinação que nasce um trabalho que realmente transforma.


12 ações que fortalecem sua identidade profissional em saúde mental

Falamos em nome da equipe da Elaine Pinheiro quando afirmamos que sustentar uma identidade profissional sólida em saúde mental não é resultado de uma escolha pontual, mas de um cultivo constante — silencioso, exigente e, acima de tudo, ético.


Não se trata de moldar um personagem clínico, mas de construir, com honestidade, o próprio modo de estar no mundo do cuidado. E esse processo exige decisões pequenas, contínuas, que, quando acumuladas, transformam a escuta, o posicionamento e a própria prática clínica.


A seguir, reunimos seis dessas decisões. Ações possíveis, reais, que respeitam o tempo de cada um e que podem ser revisitadas sempre que algo na prática parecer pedir por mais enraizamento, mais alinhamento ou mais sentido.


1. Estabelecer uma rotina de reflexão sobre a própria escuta

A escuta não é uma habilidade que se conquista de uma vez por todas — ela precisa ser lapidada continuamente. Uma identidade profissional comprometida nasce da disposição constante em olhar para o próprio modo de escutar.


Essa prática não precisa ser formal, mas precisa ser constante. Pode ser um caderno de anotações, um espaço no final do dia, uma conversa entre colegas confiáveis ou um grupo de estudos. O importante é que exista um lugar para pensar: “Como estou escutando?” “O que repito sem perceber?” “O que deixo de escutar por já supor saber?”


Esse tipo de pergunta ajuda a afastar a escuta do automatismo e aproxima o profissional de uma postura ética. Afinal, quem escuta sem se escutar corre o risco de repetir falas e condutas que já não sustentam mais a complexidade dos encontros atuais.


2. Sustentar presença clínica mesmo diante da insegurança

Ser invadido por dúvidas não significa estar despreparado. Significa, muitas vezes, estar atento. E é justamente a capacidade de permanecer — mesmo quando algo dentro se movimenta — que constrói um tipo de escuta mais maduro e potente.


A insegurança não precisa ser temida ou escondida. Ela pode ser reconhecida como parte da construção da identidade clínica. O que faz diferença é a forma como se lida com ela: a presença se torna mais ética quando é atravessada pela dúvida, e não anulada por ela.


Em outras palavras, não é sobre evitar momentos de incerteza, mas sim sobre se manter disponível mesmo quando a certeza não aparece. Isso é o que torna a presença verdadeira — e, portanto, transformadora.

3. Cuidar do próprio percurso formativo como um gesto ético

Não há identidade clínica sólida sem uma base formativa consistente. No entanto, isso não significa acumular diplomas ou frequentar formações por status. Significa escolher percursos que façam sentido, que convoquem a escuta, que desafiem certezas e que sustentem a prática de forma concreta.


Por isso, uma das ações mais importantes é assumir o próprio percurso como algo vivo, que precisa de alimento, revisão e atualização. Nem sempre isso exige grandes investimentos. Às vezes, uma leitura comprometida já transforma. Em outras, uma supervisão clínica abre caminhos. O essencial é que a formação deixe de ser obrigação e passe a ser vista como extensão do cuidado com o outro — e consigo.


Formar-se com seriedade não é vaidade. É um gesto ético.

4. Estabelecer critérios claros para aceitar casos clínicos

Muitos profissionais relatam a sensação de estarem atendendo casos que não conseguem sustentar — seja pela complexidade, pela carga emocional envolvida ou por temas que exigem uma formação mais aprofundada. Essa sensação, que geralmente aparece com culpa, pode ser um sinal de maturidade: perceber os próprios limites é também parte da construção da identidade.


Por isso, definir critérios clínicos para acolher ou não um caso não é arrogância, nem sinal de despreparo. É, na verdade, uma forma de proteger o paciente e o profissional. Esses critérios podem incluir:

  • Tipos de demanda com os quais se tem mais familiaridade;
  • Temas que pedem por mais formação antes de serem trabalhados;
  • Condições emocionais e logísticas que interferem na condução do caso.


Essa seleção, feita com cuidado e honestidade, permite que a escuta seja mais justa — e mais ética. E, no médio prazo, ajuda a consolidar um campo de atuação coerente com a proposta de trabalho.


5. Reconhecer o valor da supervisão como prática contínua

Uma identidade profissional não se sustenta apenas com teoria. Ela precisa de trocas vivas, de partilhas éticas, de alguém que possa devolver perguntas e sustentar um olhar de fora. E é exatamente esse papel que a supervisão clínica cumpre.


Mais do que um “socorro” para casos difíceis, a supervisão é um espaço de elaboração constante. É onde se pode pensar com mais fôlego, nomear afetos que passaram despercebidos, revisar posturas, identificar repetições. E tudo isso com o suporte de alguém que também já esteve — ou ainda está — no campo da clínica.


Quem incorpora a supervisão como parte da prática cotidiana cria um ambiente mais seguro para os pacientes, mas também mais saudável para si. Porque ninguém escuta de forma ética e contínua sozinho. A escuta também precisa ser escutada.


6. Criar um estilo de escrita clínica que reflita sua escuta

Nem todo profissional precisa escrever publicamente. Mas todo profissional que escuta precisa, em algum momento, escrever — nem que seja para si. A escrita não é apenas um registro técnico. É, muitas vezes, o lugar onde se processa o que ainda não foi totalmente elaborado.


Construir uma forma própria de escrever sobre a clínica — mesmo que em notas soltas — pode ajudar a dar contorno ao que ainda está disperso. E isso também fortalece a identidade profissional. Afinal, é na escrita que se observa o vocabulário que se usa, os temas que se repetem, as questões que atravessam.


Esse tipo de prática pode incluir:

  • Diários clínicos anonimizados e reflexivos;
  • Notas pós-sessão que explorem dúvidas e hipóteses;
  • Artigos para grupos de estudo ou supervisão;
  • Produção de conteúdo formativo, quando for o caso.


Mais do que um exercício técnico, a escrita pode ser vista como uma forma de escuta ampliada — um gesto que acolhe a complexidade da clínica e devolve sentido ao cotidiano.


Boas práticas que reforçam todas essas ações

Para além das seis ações detalhadas acima, vale destacar algumas práticas simples, mas muito eficazes, que podem potencializar esse processo de fortalecimento da identidade clínica:


  • Criar uma rotina semanal de leitura crítica (mesmo que 30 minutos por semana);
  • Manter uma pasta com conteúdos relevantes revisados periodicamente;
  • Participar de pelo menos um grupo formativo ou de supervisão contínua;
  • Organizar um espaço físico (ou simbólico) para atender com mais presença;
  • Revisar anualmente a própria trajetória formativa e ajustar o que fizer sentido;
  • Escolher um tema clínico por trimestre para aprofundar com consistência.


Ações para sustentar uma identidade clínica com sentido e coerência

Quando falamos em nome da equipe da Elaine Pinheiro, afirmamos com tranquilidade: desenvolver uma identidade profissional sólida é um processo que não termina. Ao contrário, vai se desdobrando conforme a clínica acontece, conforme novas perguntas surgem, conforme os encontros provocam deslocamentos que não estavam nos planos.


Se na etapa anterior falamos sobre a escuta, a formação e a supervisão como pilares fundamentais, agora é hora de atravessar outras camadas dessa construção — aquelas que lidam com o espaço público, com o cuidado ético da imagem profissional, com o pertencimento a comunidades clínicas e com a sustentação emocional de quem cuida.

A seguir, apresentamos as últimas seis ações que compõem esse caminho.


7. Cuidar da imagem profissional com ética e coerência

Ainda que a palavra “imagem” pareça superficial à primeira vista, ela carrega um peso simbólico importante no campo da saúde mental. A maneira como um profissional se apresenta — tanto presencialmente quanto nas redes sociais — comunica muito mais do que o currículo.


Esse cuidado não precisa ser moldado por tendências ou fórmulas de marketing. Ao contrário, ele pode (e deve) ser guiado por coerência interna: a forma como se comunica precisa refletir a maneira como se escuta. O tom, o vocabulário, os temas escolhidos, os espaços frequentados — tudo isso compõe o campo simbólico onde a identidade profissional se desenha.


E quando há alinhamento entre o que se diz, o que se mostra e o que se pratica, a confiança se estabelece de forma orgânica. Não se trata de parecer algo. Trata-se de ser, com clareza e responsabilidade, aquilo que se sustenta na prática.


8. Escolher com atenção os espaços clínicos e institucionais que se ocupa

Nem todo convite é oportunidade. Nem todo grupo é espaço de crescimento. E nem toda instituição acolhe a prática com o cuidado que ela merece.


Uma identidade profissional fortalecida também passa pela escolha dos ambientes onde se deseja estar. Isso vale tanto para vínculos institucionais (clínicas, centros de formação, parcerias) quanto para a inserção em coletivos, associações ou grupos de supervisão.


Essa seleção pode ser feita com base em critérios como:

  • Alinhamento ético com os princípios que regem a prática;
  • Respeito à singularidade da escuta;
  • Espaços de diálogo horizontais e não hierárquicos;
  • Clareza quanto às condições de trabalho e formação;
  • Possibilidade de construção conjunta e crescimento contínuo.


Quando se escolhe estar em lugares que respeitam o que se é, torna-se possível sustentar a escuta com mais leveza. O contrário — estar em espaços onde é preciso “performar” algo que não se sustenta internamente — costuma gerar desgaste, adoecimento e distanciamento da própria escuta.


9. Estabelecer limites saudáveis com pacientes, colegas e instituições

Limites não são barreiras. São contornos que protegem a escuta e que garantem que o cuidado aconteça de forma ética. E, por isso mesmo, precisam ser definidos com clareza — especialmente em profissões que envolvem entrega emocional, exposição subjetiva e relações marcadas por assimetrias.


No cotidiano clínico, os limites aparecem em diversas formas:

  • No horário que se está (ou não) disponível;
  • Na forma de comunicar valores e políticas de cancelamento;
  • No tipo de relação que se estabelece fora do setting;
  • Na maneira como se responde a demandas que escapam ao papel clínico.


Estabelecer esses contornos exige autoconhecimento e também coragem. Afinal, pode ser desconfortável sustentar um “não” quando tudo à volta parece pedir por flexibilidade infinita. No entanto, são justamente esses limites que possibilitam a permanência na clínica de forma ética, potente e sustentável.


10. Ampliar repertório de escuta sem se afastar do eixo clínico

Com o tempo, é natural que a escuta se refine. Mas também é natural que ela se acomode. E é aí que entra a importância de manter um repertório vivo — não para se tornar um acúmulo de técnicas, mas para continuar escutando com presença.


Esse repertório pode ser alimentado por diferentes fontes:

  • Leituras teóricas que abrem novas lentes;
  • Discussões clínicas com colegas que trazem outros olhares;
  • Experiências culturais que provocam deslocamentos subjetivos;
  • Participações em grupos interdisciplinares ou jornadas clínicas.


O cuidado aqui é não transformar essa ampliação em dispersão. É possível ampliar o olhar sem perder o eixo. E esse eixo, na prática clínica, costuma estar ancorado na ética da escuta e no compromisso com o sofrimento do outro.


11. Cultivar vínculos com colegas que sustentem trocas éticas e vivas

A solidão clínica é um fenômeno mais comum do que se imagina. Mesmo cercado de casos, horários preenchidos e interações constantes, o trabalho clínico pode, muitas vezes, isolar.


Por isso, manter vínculos com colegas que compartilham valores, que trocam sem competição, que escutam sem julgamento e que celebram os avanços sem disputas, é um dos gestos mais importantes para a saúde do trabalho — e, consequentemente, para a identidade profissional.


Esses vínculos podem surgir de grupos de estudos, de espaços formativos, de supervisões em dupla ou mesmo de afinidades que vão se revelando ao longo do tempo. O importante é reconhecer que a escuta também precisa ser sustentada por outras escutas.


E que ninguém precisa — nem deveria — cuidar de tudo sozinho.


12. Cuidar da própria saúde mental como parte da ética profissional

Por fim, nenhuma identidade profissional se sustenta se quem cuida está esgotado. A ideia de que o sofrimento faz parte do pacote do trabalho clínico é antiga — e, muitas vezes, injusta.


É claro que haverá dias mais pesados, casos mais desafiadores, momentos de exaustão. Mas isso não pode ser regra. E não pode ser romantizado. Cuidar da saúde mental não é luxo. É uma forma de respeitar os pacientes, a clínica, os vínculos e a si mesmo. Isso inclui:


  • Estabelecer pausas reais ao longo da semana;
  • Fazer terapia pessoal ou processos reflexivos consistentes;
  • Reconhecer sinais de sobrecarga antes que virem colapsos;
  • Ter momentos de vida fora do campo clínico;
  • Cultivar práticas que alimentem o corpo e a mente.


Esse cuidado, quando sustentado ao longo do tempo, reverbera diretamente na escuta, na qualidade do trabalho e, sobretudo, na capacidade de permanecer disponível sem se perder no processo.


Práticas cotidianas que ajudam a manter o eixo profissional

Para finalizar esta etapa, reunimos abaixo um pequeno checklist de práticas que, quando integradas ao cotidiano, ajudam a fortalecer as ações descritas:

  • Revisar semanalmente os limites da agenda e ajustá-los conforme a realidade;
  • Observar a coerência entre o que se publica e o que se pratica;
  • Reservar espaço para trocas com colegas, ainda que breves;
  • Escolher formações que provoquem, em vez de confirmar certezas;
  • Participar de ao menos um grupo que fortaleça o senso de pertencimento;
  • Revisar, ao final do mês, situações que exigiram reposicionamento ou renegociação de limites.


Essas práticas não são mágicas, nem prometem uma identidade clínica perfeita. Mas abrem espaço para que essa identidade seja construída com consistência, verdade e cuidado.


Dúvidas que aparecem no caminho e um convite ao prosseguimento

Falamos em nome da equipe da Elaine Pinheiro quando dizemos: não existe uma única forma de sustentar uma identidade profissional, mas há perguntas que quase sempre aparecem no percurso — especialmente quando se deseja caminhar com consistência, sem abrir mão da ética e da escuta viva.


A seguir, reunimos algumas dessas perguntas que nos chegam com frequência, tanto em atendimentos quanto em grupos de formação. Elas não pretendem dar respostas definitivas, mas abrir espaço para continuidade, para reflexão, para aprofundamento prático e subjetivo.


Preciso mesmo seguir todas essas ações? e se eu não der conta?

Essa pergunta é comum e compreensível. Em meio à rotina, às demandas, aos atendimentos e às próprias questões pessoais, pode parecer demais tentar sustentar tantas ações ao mesmo tempo.

A boa notícia é: não se trata de seguir tudo de uma vez, nem de forma rígida. O que propomos ao longo deste artigo é uma espécie de mapa — e não um checklist que precisa ser completado com urgência.

É possível começar por uma ação. Ou revisitar outra que já havia sido esquecida. O importante é reconhecer onde a escuta precisa de mais apoio, e o que faz sentido no momento atual da sua prática.

Além disso, vale lembrar: o cuidado com a identidade profissional também passa por aceitar que há fases de mais expansão e fases de mais contenção. E isso não representa retrocesso, mas sim escuta da própria trajetória.

Como saber se estou realmente construindo uma identidade profissional coerente?

Essa dúvida aparece de forma silenciosa, muitas vezes. Ela se revela quando há desconforto com a prática, quando o atendimento começa a se tornar repetitivo, quando os vínculos clínicos ficam frágeis ou quando a imagem profissional parece desconectada da escuta real.

É importante saber que não existe uma régua única para medir coerência, mas há alguns sinais que ajudam a perceber se o caminho está sendo trilhado com verdade:

  • A forma como você fala sobre seu trabalho faz sentido com a forma como você escuta?
  • Seus limites estão sendo respeitados por você mesmo?
  • As trocas com colegas nutrem ou desgastam?
  • Os espaços que você ocupa te ajudam a crescer ou te diminuem?
  • Você reconhece, com alguma leveza, o caminho já percorrido?

Essas perguntas não exigem respostas rápidas. Mas são boas companheiras para sustentar uma prática que respeita o que se é, e não apenas o que se espera ser.

Existe um momento certo para buscar supervisão ou fazer uma nova formação?

Frequentemente, essa dúvida surge acompanhada de outra: “Será que não estou sendo dependente de supervisores e cursos?”.

A resposta mais honesta talvez seja: depende do lugar de onde essa pergunta está vindo.

Se vem de um desejo genuíno de aprofundar, de não caminhar sozinho, de continuar aprendendo, então ela pode ser um convite valioso. Mas se vem de uma ansiedade por preencher lacunas, por se sentir “atrasado” ou “incompleto”, talvez o primeiro passo seja cuidar da comparação.

Na prática, não existe um “momento ideal” universal. Mas existem sinais que indicam quando o acompanhamento clínico (supervisão, análise, grupos de estudo) pode ser bem-vindo:

  • Sensação de repetição nas escutas;
  • Insegurança persistente diante de certos casos;
  • Dificuldade de sustentar os próprios limites;
  • Desejo de repensar a abordagem ou ampliar repertório;
  • Isolamento na prática, sem espaços de troca.

A partir daí, o importante é escolher com critério: quem supervisiona também escuta com ética? O grupo oferece espaço para dúvida, ou só para validação?

Essas respostas ajudam a tornar a formação continuada uma escolha consciente e não um preenchimento compulsivo.

E quando a dúvida é se devo continuar na prática clínica?

Essa é uma pergunta que, por vezes, aparece com culpa. Como se duvidar fosse errado. Como se repensar caminhos significasse fracasso.

Mas a dúvida, quando acolhida com honestidade, pode ser um portal. Ela revela que algo está em movimento. Que talvez o que antes fazia sentido hoje precise de outras formas. E que a identidade profissional também pode mudar sem perder coerência.

Há muitos motivos legítimos para rever a prática clínica:

  • Mudança de interesses teóricos;
  • Sobrecarga emocional ou física;
  • Desejo de migrar para áreas institucionais, formativas ou de pesquisa;
  • Incompatibilidade com os modos de funcionamento da clínica autônoma;
  • Vontade de reinventar os formatos de trabalho.

E nenhuma dessas razões deslegitima o percurso até aqui. Pelo contrário: poder olhar para a própria história e escolher novos rumos é um sinal de escuta viva.

Checklist de cuidado ético no cotidiano clínico

Pensando em facilitar essa reflexão prática, organizamos um pequeno checklist com atitudes que costumam fazer diferença no cotidiano de quem deseja sustentar a identidade profissional com presença, ética e leveza:

  • Parar pelo menos uma vez por semana para se perguntar: “O que, da minha prática, faz sentido para mim hoje?”
  • Anotar dúvidas clínicas que aparecem com frequência e observar se elas se repetem — isso pode indicar um tema para supervisão ou estudo.
  • Revisar os canais de comunicação profissional e avaliar se eles refletem, de fato, a escuta que se pratica.
  • Observar os tipos de parcerias e instituições com as quais se mantém vínculos: há coerência ou desgaste?
  • Separar momentos reais de pausa — não só ausência de atendimentos, mas tempo sem demandas externas.
  • Reconhecer avanços, por menores que pareçam. A construção da identidade profissional se dá também no cotidiano silencioso.

Esse tipo de atenção diária não precisa virar mais uma cobrança. Pode ser, na verdade, um gesto de cuidado — com a clínica, com os pacientes e consigo mesmo.

A identidade profissional como construção viva e em movimento

Chegamos ao fim deste artigo, e talvez o mais importante a dizer neste ponto seja: a identidade profissional não é um título, um rótulo ou um destino final.

Ela é um processo. Um conjunto de escolhas éticas. Um campo em constante construção, atravessado pelas escutas, pelas formações, pelos vínculos, pelas pausas e pelas dúvidas.

Não precisa ser perfeita. Precisa ser sustentada com verdade.

Falamos em nome da equipe da Elaine Pinheiro quando reafirmamos: quem atua com escuta clínica sabe que o que se vive no dia a dia da saúde mental não cabe em fórmulas prontas. Mas cabe, sim, em percursos cuidadosos, em estratégias construídas com paciência e em escolhas que respeitam o tempo de cada um.

Se você chegou até aqui, talvez já esteja nesse caminho. E se ainda há trechos nebulosos, é possível seguir caminhando com apoio, estudo e presença.

Perguntas frequentes (FAQ)

Qual é a diferença entre formação contínua e acúmulo de cursos?

Formação contínua é aquela que provoca, desloca, amplia a escuta. Acúmulo de cursos muitas vezes só preenche tempo e currículo. A diferença está na qualidade da experiência e no impacto real na prática clínica.

Vale a pena publicar conteúdo nas redes sociais mesmo sem ter “domínio” do marketing?

Sim, desde que haja coerência entre o que se publica e o que se pratica. A comunicação não precisa ser perfeita — precisa ser ética, clara e compatível com a escuta que se sustenta.

Tenho poucos pacientes. Isso significa que minha identidade profissional está fraca?

Não necessariamente. O número de atendimentos não é o único indicador. O importante é observar se há coerência, se a clínica está sendo sustentada com presença, se há movimentação subjetiva e ética no percurso.

O que fazer quando sinto que “perdi o eixo” da minha escuta?

Esse sentimento pode indicar a necessidade de pausa, de supervisão, de retorno à análise pessoal ou de reorganização da rotina. Perder o eixo não é fracasso — é um pedido de cuidado.

Se essa leitura fez sentido para você, talvez seja o momento de seguir aprofundando com mais consistência. A Elaine oferece grupos de estudo, espaços formativos e acompanhamento para quem deseja sustentar a clínica com ética, verdade e escuta viva.

A identidade profissional é construída com presença. E essa construção, quando feita com cuidado, sustenta quem cuida — por muito tempo.

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